Com a evolução do conhecimento do neurodesenvolvimento, novos métodos de avaliação foram aparecendo e indiciando a PEA como uma perturbação do desenvolvimento do sistema nervoso central, provavelmente de origem pré-natal (Filipe, 2012)1. No entanto, o autismo apenas foi incluído como perturbação de desenvolvimento, na 3ª edição do Diagnosis Statistical Manual (DSM-III – American Psychiatric Association, 1987), para no DSM-IV (APA, 1994)2 ser integrada na categoria de Perturbações Globais do Desenvolvimento, incluindo diferentes subtipos: síndrome de Asperger, perturbação desintegrativa da segunda infância e perturbação de Rett. Estas últimas foram excluídas na mais recente versão do manual – DSM-V (APA, 2013)3 e o autismo assume a designação de Perturbação do Espetro do Autismo, dada o seu perfil e a gravidade variáveis (Filipe, 2012), estabelecendo-se os seguintes critérios de diagnóstico (APA, 2013):
A. Défices persistentes na comunicação e interação social, em todos os contextos do indivíduo, no presente ou no passado:
1. Défice na reciprocidade social e emocional que pode ir desde a aproximação social desajustada e limitação na conversação, reduzida partilha de interesses, emoções e afetos, dificuldades em iniciar ou em responder a interações sociais;
2. Défice nos comportamentos comunicativos não-verbais usados para a interação social, que podem variar desde a fraca integração da comunicação verbal e não-verbal, a alterações no contacto ocular e linguagem corporal; limitações na compreensão e uso da comunicação não-verbal, assim como ausência total de expressão facial ou gestos;
3. Défice no desenvolvimento e manutenção de relações apropriadas ao nível de desenvolvimento (além dos cuidadores), que se pode traduzir pela dificuldade na adequação do comportamento à mudança de diferentes contextos sociais, na partilha de jogo imaginativo e em fazer amigos, com aparente falta de interesse nas pessoas;
B. Padrões de comportamentos, interesses ou atividades restritos e repetitivos, manifestados em pelo menos 2 dos seguintes critérios:
1. Discurso, movimentos ou utilização de objetos restrita ou repetitiva (e.g.: estereotipias motoras, alinhamentos de brinquedos ou rodar objetos, ecolalia, frases idiossincráticas);
2. Adesão excessiva a rotinas, padrões ritualizados de comportamento verbal e não-verbal ou resistência excessiva à mudança (e.g.: stress extremo a pequenas mudanças, dificuldade com as transições, padrões de pensamentos rígidos, rituais de saudação, necessidade de ir pelo mesmo caminho ou comer todos os dias a mesma refeição);
3. Interesses altamente restritos e fixados caracterizados como “anormais” na intensidade e no foco;
4. Hiper ou hiporreatividade ao input sensorial ou interesse incomum em aspetos sensoriais do ambiente, como aparente indiferença à dor/temperatura, resposta adversa a sons específicos ou texturas, toque ou cheiro excessivo de objetos, fascinação por luzes ou objetos que rodam, etc.;
C. Os sintomas devem estar presentes desde cedo na infância mas podem não ser completamente manifestados até que as exigências sociais excedam os limites das capacidades
D. No seu conjunto limitam e criam limitações na funcionalidade diária
E. Não podem ser explicadas por outras perturbações de desenvolvimento
Quanto à gravidade, as PEA podem classificar-se em 3 níveis, segundo o DSMV:
Nível de gravidade |
Comunicação e interação social |
Interesses restritos e comportamentos repetitivos |
---|---|---|
Nível 1: Requer apoio |
Sem apoio, défices significativos na comunicação social |
Interferência significativa em pelo menos 1 contexto |
Nível 2: Requer apoio substancial |
Défices marcados com iniciação limitada e respostas atípicas ou reduzidas |
Óbvio para o observador acidental e ocorre em todos os contextos |
Nível 3: Requer apoio muito substancial |
Comunicação social mínima |
Interferência marcada no dia a dia |
Em termos de prevalência, os estudos a nível mundial apontam para uma prevalência de casos de autismo entre os 0,62 e 0,7% (Elsabbagh, 2012)4, chegando aos 1-2% em outros estudos (Fombonne, 2011)5
Em Portugal existe apenas um estudo realizado por Oliveira (2005)6 que aponta para uma prevalência estimada em Portugal de cerca de uma em cada mil crianças de idade escolar.
1 Filipe, C. (2012). Autismo conceitos, Mitos e Preconceitos. Lisboa. Babel
2 American Psychiatric Association. (1994). Diagnostic and statistical manual of mental disorders (4th ed.). Washington, DC: Author.
3 American Psychiatric Association. (2013). Diagnostic and statistical manual of mental disorders (5th ed.). Washington, DC: Author.
4 Elsabbagh M, Divan G, Koh YJ, et al. Global prevalence of autism and other pervasive developmental disorders. Autism Res 2012; 5: 160–79.
Fombonne E, Quirke S, Hagen A. Epidemiology of pervasive developmental disorders. In: Amaral DG, Dawson G, Geschwind DH, eds. Autism spectrum disorders. New York, NY: Oxford University Press, 2011: 90–111.
5 Mattila ML, Kielinen M, Linna SL, et al. Autism spectrum disorders according to DSM-IV-TR and comparison with DSM-5 draft criteria: an epidemiological study. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 2011; 50: 583–92.
Saemundsen E, Magnusson P, Georgsdottir I, Egilhttps://appda-lisboa.org.pt/node/2/edit#sson E, Rafnsson V. Prevalence of autism spectrum disorders in an Icelandic birth cohort. BMJ Open 2013; 3: e002748.
6 Oliveira, G. (2005). Epidemiologia do autismo em Portugal: Um estudo de prevalência da perturbação do espectro do autismo e de caracterização de uma amostra populacional de idade escolar. Coimbra: Universidade de Coimbra.